quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Aeromoças

Um vôo entre Braslia e São Paulo dura cerca de 90 minutos. Os arranjos iniciais e finais de decolagem e pouso consomem 30 minutos. Se o modelo for um 737-700 e meus cálculos estiverem corretos são 144 assentos/pessoas ocupando espaço dentro do espigão. Por pura boa vontade dos donos das companhias aéreas, o custo/acessibilidade ao meio de transporte flutuante possibilitou que milhares de pessoas tirassem fotos/selfies nas nuvens. No entanto, toda revolução provoca perdas e adaptações: a distância entre as poltronas diminuiu, o apoiador de cabeça foi pro saco e a comidinha de isopor passou a ser cobrada (superfaturada). Mas até aqui nenhuma novidade: viajar para visitar os amigos a 156 reais + 40 pilas de taxa de embarque em 6 vezes tá valendo! O que pretendo dividir com vocês é a agonia no olhar vidrado e sorridente das aeromoças: " deseja uma água de cortesia ou algo do cardápio senhora?". Coitadas! Repetem a exaustão (144 vezes), não podem deixar cair uma gota de água nem de suor durante os 60 minutos de serviço; precisam administrar o pedido, pagamento e entrega dos produtos numa corrida contra o tempo, além de se manterem atentas ao bom funcionamento do vôo, evitando que as criancinhas não derrubem a aeronave com seus brinquedos eletrônicos, não vomitem no colo do vizinho e utilizem os sanitários localizados no fundo da cabine apenas para fins fisiológicos.
E se você pensou que bastou preencher uma ficha de trabalhe conosco para conseguir esse emprego; ledo engano. Aquela moça loura, magra, elegante e finalizada no gusmeque passou horas lutando na selva contra seres selvagens e peçonhentos, contra a fome , o frio, o excesso de umidade aniquilador de qualquer chapinha e uma tropa de outras louras aspirantes a mesma posição, detalhe: in english. Afinal comissária que se preze salva a tripulação de queda em alto mar com classe: ladies and gentlemen keep your seatbelts fastened because we are going to hell.
E já que estava lá, praticando a arte da associação livre, resolvi calcular o tempo médio gasto com cada passageiro: entre os totalmente convictos ( "não obrigado, apenas um café ou o combo 1 por favor"), os indecisos ( "posso trocar o snak do combo 1 pelo do 2, tem pão de queijo ou dá para esquentar o lanche?") e os nulos ("ronc ronc"), gastaram cerca de 38 segundos por cabeça. Coitadas! Apesar do aumento da freguesia, o investimento nas condições mínimas de trabalho continuam precárias; enquanto a elite da cabine pode operar a máquina apenas com instrumentos, as operárias precisam segurar a garrafa de 2lts de refrigerante com uma só mão! Bom, fato é que cálculos aritméticos simples indicaram que a turma da poltrona 18f a 29d rodaram!
Mas trabalho em equipe é tudo; ciente da situação das companheiras o piloto lançou um aviso sonoro de "área de turbulência" justificando o encerramento das atividades. Entre a vida e o amendoim os menos favorecidos se resignaram a condição de famigerados e suportaram o resto da viagem acreditando na promessa da Baked Potato do aeroporto de Congonhas.
Hora e meia depois estávamos sãos e salvos em terra firme, felizes com a viagem , a prestação do cartão e solidários a dor alheia: contra meus 50 minutos de sessão, elas só têm 38 segundos para atender seus clientes.
#tareclamandoque #boratrabalharminhagente

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