quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

O que é certo é certo

Depois as criancinhas ficam confusas e ninguém sabe porquê. 
Jogar bebezinho no lixo pode, internar a irmãzinha no hospital psicochoque também pode, xingar a secretária de cadela, roubar o dindin do papis, chantagear uma legião de pessoas confusas  e demonstrar e praticar toda sorte de preconceito são atos super recomendados. 
E mais, se você fizer tudo com muito esmero, no final você ganha ... tcharam!!! A diretoria do master hospital center São Longuinho.
Agora, se você escovar os dentes antes de dormir, fazer a lição de casa, arrumar os brinquedos, tomar banho e respeitar os outros, ah! o máximo que você ganha é um parabéns meu querido ?!
Fala sério, que vantagem Maria leva?

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Coração Peludo

Meu nome é Coração Peludo. Eu tenho 35 anos e habito um corpo de 40. Até os 5 eu não era peludo, talvez tivesse um ou outro pêlo encravado; nada que comprometesse meu caráter, até que um dia, um camarada que jurava ser meu amigo fez o favor de quebrar meu presente de aniversário no dia do meu aniversário. Virei  jardim de praga, em meia hora me transformei na Monga e de lá pra cá só venho me aprimorando. 
Bom, essa breve introdução não tem a intenção de tocar a sua boa alma - até porque elas não existem - ou comovê-lo com a pataquada de uma história infantil; o que eu pretendia era esclarecer que eu , você e o  Zubumafu (nome do demo versão Discovery Kids) somos maus, muito maus. 
Embora meu maior desejo seja dominar o mundo com minhas más intenções, sou obrigado a acatar as ordens da gerente. Trata-se de uma moçoila que em geral, pretende fazer só coisas boas. Ridícula! Para minha sorte, as vezes, ela arrefece e então eu boto pra quebrar. Foi o que aconteceu hoje a tarde. O sol estava escaldante, o ambiente barulhento, a cerveja gelada e quando ela se deu conta já havia pedido uma caipirinha. Em dois goles dominei a área. 
O plano era o seguinte: para cada atitude idiota, uma vingança imediata. Piece of cake! 
A figura havia nos levado para um hotel fazenda esquema cruz credo. Entre excursões da CVC (o trem é tão ruim que já virou adjetivo), turmas da terceira idade (nunca vi tanto andador estacionado na porta do restaurante), famílias inteiras repletas de barrigudos folgados e criancinhas ranhetas, estavam eles: o casal apaixonado. 
Alvo fácil!  Passaram o dia num lenga-lenga, beijinho pra cá , mão boba pra lá, pediram pró seco antes do almoço, nadaram abraçadinhos durante a aula de hidro - brega - ginástica e as 14h, minutos antes do término da hora do almoço, a perua siliconada, de bruços, sem biquini e em posição elevada fez o seguinte comentário: " Gente brega, né bebê! " Bastou para o radar ser ativado. E a vingança - enganam-se os poetas - não é um prato que se come frio , aqui em casa é servido fumegante! A fofolete turbinada havia se besuntado de protetor importado minutos antes do bebê decidir jogar uma partida de futebol com os pâncepes da barraca ao lado. Assim que ele saiu, abduzi um pentelho munido de um balde de água cheio de areia a arremessar nas costas da moça. Cômico. Não só ela virou um lagarto a milanesa, como ela não podia levantar porque o bebê deixou o biquini na bolsa. Uma hora e meia no grill da piscina. Háhá! A noite promete, costas em bolha! Adoro! 
Mal enchi o copo de cerveja foi a vez do careca folgado. Liberei a isca e a bola das crianças na piscina repleta de Chucks, incluindo os filhos do careca. Deixei a vontade porque eu sou legal. Brincaram, gritaram, quase estouraram e eu só observando. Quando cansei do sol infernal avisei o pança que poderia ficar com a bola e eu estaria na mesinha da direita. Era só devolver quando fosse embora. Mas é claro que a atitude foi outra. O infeliz deu de ombros, arremessou a bola no meio da piscina e partiu. Outro alvo fácil! Bastou levantar com a máquina fotográfica importada no pescoço e o Raider no pé que eu desejei o mal. Ganhei distância e assim que ele aportou no primeiro degrau ... katapum ... tomou um baita tropicão. Máquina espatifada, chinelo arrebentado e a abundância grande arrebitada pra galera ver. Fez mais sucesso que o tio da animação. Bingo!
Pedi uma água , minha gerente já tava começando a dar vexame. Decidiu dançar forró em trajes de banho, era hora de hidratar. Fiz até amizade, perguntei o nome da criancinha,  dividi as fritas, comentei o livro do japonês do guarda-sol ao lado. Luxo só! Pura simpatia! Marquei até um tênis pras 6 - mesmo sem nunca ter tocado numa raquete. Decidi por um cochilo até a hora da massagem. A programação da tarde estava garantida. A massoterapeuta foi uma lady, não fez nenhum comentário deselegante , disse até que meus músculos eram rijos. Querida! Deve ter coração peludo, dei caixinha gorda, 20 reais. Fui me refrescar. As 6 estava eu, linda e loira, de faixa e tudo, pronta para o desafio. Arrasei! Bolinha pra lá, bolinha pra cá , fiz mais ponto que o menino Kuerten.  Meu marido gritava: linda! Mas a adversária não curtiu, não sei porque, inveja da performance. Fiquei com uma pontinha de raiva e decidi jogar as bolinhas para estrada , além muro, tipo filme de espiritismo. Babaca! Pedi desculpas e fui, rumo a caipiroska de maracujá. Adoro chupar as sementinhas. Faltava uma hora para o jantar. Precisava tomar banho, encontrar a galera para um drinque e liquidar minha meta de maldades. Não me levem a mal, tenho minhas preferências, em geral as minorias. Gosto muito de velhinhas que passam horas chupando os palitinhos de madeira ao invés dos canudos da batida, mulheres acima do peso e crianças ágeis (costumam cair) . Simpatizo também com todos os atendentes, sufocados pelo uniforme verde oliva e a camisa florida com a plaqueta  escrito  Emocionador (mico garantido). Mas eu gostei mesmo da chinesa que meteu uma bóia de pescoço na filha de 2 anos e largou na parte funda do piscinão de Ramos. Trabalhando o desapego. A filha do Jaspion chorou tanto que aprendeu a nadar. Economizou 2 anos de natação. Por isso os caras tão dominando o mundo. E nos, contando centavos de dólares a cada volta de Miami. Gentinha! Quase satisfeita me aprontei para encarar a fila de famigerados. É impressionante como as pessoas brigam por míseras batatas fritas, e fica muito pior quando o chef decide propor bolinho de bacalhau. Guerra! Nem a pobre  repositora do buffet (minoria, lembram?!) trouxe a bandeja; acabou. Já vi pisotearem pessoas por bolinho de arroz, agora imaginem quando o tema é bacalhau.  Fato é que o maitrê decidiu recriar o caos e de sobremesa ... surpresa!!! Banana flambada. Escalaram um escravo moderno para pilotar o fogão cinco bocas com milhares de frigideiras, toneladas de açúcar, cachos empilhados e um galão de rum. Sem equipamento de segurança e cerca de quinhentas pessoas a espreita deu início aos trabalhos. Se tudo desse certo acabaria com a fila antes do pessoal da omelete e da tapioca montarem acampamento. Minha vontade nem era tanta, mas optei por uma boa ação no final da jornada (quem sabe alguém lá de cima perdoava) e encarei a muvuca para satisfazer o desejo da vovó (lê-se 98 anos). De longe observo uma jovem senhora - pelo menos uns 40 a menos que a vovó e um topete erguido a base de dois quilos de laquê - empatando o bom andamento da fila. Pelos meus cálculos ela já tinham se servido de oito porções - " só mais uma, essa é pra minha nora" - e a galera do fundão contando as bananinhas com medo de faltar, afinal a promoção era clara: uma por pessoa. Não tive dúvida; repleta de aliados - nessa hora os pêlos se alvoroçam, alguns saltam até pela boca - desejei minha última vingança do dia. Se rum era inflamável e laquê também, a receita era aumentar o fogo e ... shazam: franja chamuscada, ops! flambada. Nada grave. Em poucos meses ela faria o topete novamente. 
Estava exausto e realizado. Se bem conhecia minha gerente amanhã ela acordaria com uma baita ressaca e, oportunidade como aquela levaria pelo menos uma semana para acontecer. 

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

A base da nossa relação é uma mentira. Eu menti para ele na primeira vez, na segunda, na terceira e desde então, minto pelo menos duas vezes por semana. Normalmente minto as terças e quintas sempre no mesmo horário, por volta das 20h30 para não levantar suspeitas. As vezes tenho certeza que ele sabe, noutras ele disfarça tão bem que penso que nem desconfia. Eu chego com a maior cara lavada do mundo e ele me recebe sorrindo, com aquele caloroso boa noite. Faz de tudo para me proteger, se certifica se estou segura. Quando aviso para onde vou, mesmo sabendo que se trata de uma farsa, de um pretexto barato para levar vantagem, ele consente sem questionar. Mas já aconteceu, e talvez isso venha acontecendo com frequência, de ele me desejar bom descanso. Nessa horas eu sei que ele sabe e por algum motivo nega a realidade. Porque será? O que faz alguém viver na mentira? É como se aceitasse que naquela noite eu não voltaria. Talvez tenha cansado de esperar, foram anos esperando que eu voltasse e nada. Em janeiro faremos sete anos juntos; sete de anos de mentira. Tá na hora de acabar com isso. Tomei uma decisão, quando 2014 chegar e nos encontrarmos de novo lá na portão central da USP, após as oito da noite, horário proibido para turistas e ele, o guarda, perguntar para onde vou, ao invés de dizer que vou para a psicologia direi que vou para física. Espero que ele acredite.