terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Pobre Valmir

Valmir é um cara pacato, de poucas palavras e duas expressões.
Uma serve para receber, a outra para despedir.
Quase invisível, garante sua importância na falta. Tudo resolve: urgências hidráulicas, problemas com o computador, recebimento de mercadorias; Valmir sabe fazer e quando não sabe, conhece quem faça. Às vezes, no socorro de um estômago faminto, cobre o horário de almoço dos colegas.
Foi o que aconteceu hoje.
O trabalho rotineiro consiste em cadastrar o visitante e encaminha-lo para o lugar devido.
O diálogo (breve) segue o texto: comprimento (bom dia, tarde ou noite), RG, qual conjunto.
Em geral, 30 segundos são suficientes para cumprir o roteiro.
Menos hoje.
A senhora não constava na lista dos pacientes do conjunto 112.
Incauto, perguntou se o dia era aquele mesmo.
Pra quê!?

Claro moço, disse a senhora, o doutor marcou de tirar os pontos hoje. Nem sei se precisava, já tá tão sequinho que era só puxar. Foi uma cirurgia rápida. Ele começou a passar mal depois do aniversário da bisneta. Da segunda, a primeira fez em outubro, dia 18, mesmo dia que minha falecida mãe. Eu disse pra não comer tanto, mas meu neto, pai da primeira, preparou aquele prato espanhol, sabe?! Que vai camarões deste tamanho. Comeu de repetir. À noite se queixou de estufamento, fiz um chá de boldo, bem forte, mas não adiantou. Vomitou até ficar verde. Não ele, o vomito. Fiquei preocupada e liguei pro meu filho, o avô da segunda. Velho pode desidratar, né?! Fomos pro hospital e o médico do pronto-socorro, muito atencioso, fez um exame e logo viu a pedra. Eu sabia, minha irmã já tirou a vesícula. No começo ficou enjoada, mas depois melhorou. Não pode muita fritura, mas é só fazer tudo no forninho. Logo veio o outro doutor e disse que era caso de cirurgia. Quase não deu tempo de buscar uma troca de pijama. Pedi pra minha neta passar em casa e pegar na primeira gaveta da cômoda. No dia seguinte cedinho  operou e, graças a Deus, deu tudo certo. Preciso lembrar de rezar uma novena pra Santo Expedito. Se você quiser o nome do médico eu passo, muito atencioso. Se  tiver convênio ele da recibo. Meu filho que cuida disso, mas eu sei que não precisa nem pagar. Ah! Você conhece o doutor?! Ah ... É mesmo! Aqui do prédio, já tinha até me esquecido. Mas eu tenho certeza que é hoje . Que dia é hoje mesmo mocinho? 26? Não é 27? Mesmo? Perai, deixa eu ver aqui , aqui, cadê o papel que eu anotei ... achei, dia 27 de janeiro as 13 e 15. Desculpa, acho que  confundi. Como é mesmo seu nome? Ah! Obrigada pela atenção Valmir, então nós vemos amanhã.

A fila chegava no 722 da Santo Amaro, todas as agendas do dia atrasaram, a multidão clamava por pressa, transeuntes especulavam sobre a promoção do mercado,  incêndio no prédio, talvez passeata.
Valmir, inábil no gesto de calar, pediu folga e emendou férias antecipadas.

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