E a tromba do elefante serve para pegar pistaches sem baixar,
e o rabo do macaco serve para ficar tonto de tanto dar pirueta, e a língua do
gato serve para coçar a pata de trás, e as antenas da formiga servem para
equilibrar as pétalas das flores.
E para que serve uma tarde livre de trabalho?
Serve para tirar o sapato, e sentar no penúltimo degrau da escada, e olhar de
olhos fechados para o sol, e escutar quinze vezes a mesma música. Serve para
tomar um café longo e um copo de água com gás cheio de gelo, e para dividir um
brigadeiro. Serve para deitar no divã, e dormir, e acordar depois da hora.
Serve para demorar tempo em cada vitrine, e não comprar nada. Serve para ler
todas as manchetes das revistas da banca de jornal, e para comprar um gibi
velho. Serve para ler a sinopse de todos os filmes em cartaz, e para descobrir
os próximos lançamentos. Serve para ir ao cinema, sempre. Serve para lavar o
cabelo no salão, e pagar pela massagem extra, e pelo shampoo especial, e para
fazer a sobrancelha de novo. E serve para pintar a unha da mão de verde, e a do
pé de amarelo, e para tomar cappuccino mesmo se estiver calor. Serve para
organizar sua coleção de bolinhas de gude, e testar todas as canetas esquecidas
no canto da mesa, e para rasgar os papéis velhos. Serve para alugar uma
bicicleta no parque, e dobrar a calça, e pedalar descalça, e depois deitar na
grama, e olhar para o sol de olhos fechados. Serve para conversar com um
estranho, e ligar para sua avó, e gastar horas descobrindo nada na internet.
Serve também para nadar sozinha no clube, você e sua touca, e seu pé de pato
rosa, e seus óculos feios. E, se alguém estranhar, serve para pular do
trampolim desse jeito esquisito. Serve para escrever, e ler, e escutar mais
quinze vezes aquela música. Pode servir para sentir saudades, para fazer lista
de saudades, e para lembrar os melhores beijos de língua. E serve para sentir
vontade, e imaginar, e dar risada sozinha. Se tiver em casa, serve para cortar
unhas de filho, e limpar a orelha com cotonete, e fazer cafuné até dormir.
Serve para contar moedas do cofre, e separar por valor, e fazer lista de
compras com as moedas do cofre, e depois para guardar tudo de novo. Serve para
cozinhar, e para bater bolo, e para assar uma torta na companhia da taça de
vinho branco gelado. E se tiver em casa, sem filhos, serve para fazer amor, ou
para fazer sexo, ou para fazer tudo junto no sofá da sala. E serve mesmo para
se espreguiçar, longa e demoradamente, e sempre. Serve para tanta coisa.
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