quarta-feira, 20 de março de 2013

Recall


Recall 

Duas notícias essa semana chamaram minha atenção. Ambas diziam respeito aos famosos recalls impostos pelas grandes empresas. No primeiro deles, certamente conhecido por todos, um fabricante de bebidas, consumidas em abundância por crianças, veio gentilmente a público para avisar que junto com o suco sem lactose a base de soja sabor todas as frutas, algum desavisado derramou um tonel de detergente. Nada grave, afinal há muito se sabe que sabão não faz mal a ninguém. Dias depois foi a vez de outro fabricante, agora de lâmpadas, avisar o consumidor que o lote xyz apresentava um pequeno problema de choque, era só encostar na peça em contato com a eletricidade que você poderia receber uma leve descarga ou presenciar a explosão da lamparina. Também nada grave, afinal eram somente 110 volts, não mata ninguém. 
Há mais ou menos um mês, uma friendface postou que seu carro zero rolou ladeira abaixo por um pequeno defeito no freio de mão. A empresa organizou um "chamado de volta" para evitar problemas futuros. Nada tão grave, o poste que freiou seu carro estava ali para isso. 
Um pouco mais lá atras, cerca de seis anos, recebo um telefone dos vizinhos no meio do expediente, pedindo que eu voltasse para casa pois, apesar de todos estarem sãos e salvos, minha residência havia pegado fogo. Nada grave, só a lavanderia, pertinho pertinho dos botijões de gás . Com a calma de um boi laçado, quase fui teletransportada de tão rápido que cheguei. Os meninos, na época com 5 e 1 anos, estavam no quintal com a babá que colocava o pequeno para dormir e decidiu fechar a porta da lavanderia para o barulho da máquina de lavar não incomodar. A porta serviu de corta-fogo impedindo que o mesmo não entrasse para os cômodos. Sentiram um cheiro de queimado a tempo do guarda da rua e dos vizinhos derrubarem a porta e o fogo apagar. A conclusão coletiva  foi que o acidente sem vítimas começou no eletrodoméstico. Ligamos para a fabricante que, com a sutileza de dois bois laçados, informou que as máquinas dos lotes xyz tiveram recall por problemas de curto circuito no painel eletrônico acarretando, ocasionalmente, incêndios. Sendo uma pessoa bem humorada, perguntei para a  fofolete da atendente como eu poderia saber de tal procedimento. Garbosamente (Chique, né!? Tô arrasando nos sinônimos! ) respondeu que o chamado acontecera nos programas televisivos femininos, que passam as nove horas da manhã, senhora! Aí eu perdi a elegância. Primeiramente porque as nove da manhã, como já escrevi em outros textos, eu trabalho feito um camelo com sede, invés de anotar receitas de bolo. Depois porque os caras, além de cobrarem uma bica por um bagulho que fica chacoalhando minha roupa no ritmo tchutchatchutcha, inventaram um painel eletrônico digital com opção água morna filtrada que conserva o tecido por mais tempo e esqueceram de verificar que alguma coisinha deu errado e poderia por fogo nas casas!? Fala sério!  
Fiquei pensando: já imaginaram recall de psicanalista? E de médico? 
Cena 1: Domingão,   largado no sofá, pós operatório, curtindo o Faustão em pleno processo de recuperação, no meio dos reclames do plin plin sobem as letrinhas reconvocando os pacientes que fizeram cateterismo no ultimo mês para verificar se o desentupimento ocorreu na artéria correta. 
Cena 2: Bar, lágrimas, dor de amor, você passa os olhos no suplemento cultural do jornal de domingo e depara-se com as letrinhas impressas, convocando os analisantes que passaram a ultima década largados no divã a comparecer no consultório mais próximo, pois a interpretação feita sobre o complexo de Édipo foi equivocada e poderá trazer danos as relações amorosas. Descobriram que o Laio não era o pai, era apenas um primo de de terceiro grau.  
Fim da história : a empresa da máquina ressarciu o prejuízo material sem pestanejar, com direito a visita pessoal de um advogado para que assinássemos um documento comprobatório e minha avó acendeu velas artificiais por uma semana agradecendo aos santos por nada grave ter acontecido. 
O que posso dizer ... errar é humano, mas não ter a dimensão do que o erro pode acarretar é crime. 

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