quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Café e primatas


Uma das formas de medir o desenvolvimento da espécie humana é verificar o tipo de líquido que tomamos no café da manhã. Os bebês refastelam-se no leite materno, as crianças encaram por obrigação um chocolate morno, os adolescentes por preguiça mantém a bebida em outra temperatura, chocolate frio; os jovens, por questões ilícitas alternam entre suco de laranja, Gatorade e coca zero. Fim de faculdade, primeiro emprego, encaramos um bom café com leite e com o passar do tempo, não raro, o desjejum resume-se a uma xícara grande de café preto até que, algum geriatra, indique apenas chá de capim cidreira.
Café também serve de desculpas pra tudo: pausa para o trabalho, discussão de caso, fofocas, DR; adiamos o fim quando pedimos mais um. 
Um dia desses, entre um cafezinho e outro, acompanhei uma discussão sobre senso de justiça e a capacidade de sermos incorruptíveis. Como não tratava-se de um júri, pude refutar a argüição da defesa que afirmava categoricamente há existência de pessoas imunes as tentações mundanas. 
Eu mesma não conheço, mas a figura em questão jurou que há. Pensei: como pode, se até para nos constituirmos psiquicamente somos arrancados da integridade fetal para nos corrompermos em outro? Enfim ...
E como um bate papo feminino nunca acaba lembrei de uma outra conversa entre cafés a respeito das relações entre pais e filhos e a noção de atavismo. 
Um bando de cientistas reuniu um bando de macacos e propôs - aos outros cientistas - a seguinte experiência: 5 símios dentro de uma jaula, com uma escada ao centro que dava acesso há um cacho suculento de bananas; 4 deles permaneceriam no chão enquanto 1 subiria a escada em busca do alimento (famintos só se f*!). Quando o escalado chegava ao topo o pesquisador jogava água fria nos debaixo e ao descer esse pobre era espancado pelos demais. E assim foi, um a um subia, comia e ao descer, porrada. Depois de um tempo ninguém mais se atrevia a olhar para a escada, aliás, ótimo método  de dieta ... Decidiram então, substituir um a um os 5 veteranos por novatos. Quando o primeiro colocou uma patinha no degrau, mesmo sem conquistar a banana e nem mesmo a água cair, foi alvo do MMA de primatas.  O mesmo aconteceu com os seguintes: pezinho no degrau = fúria titânica da galera. Até que, mesmo quem nunca vivera a primeira experiência de repressão socava os demais por imitação. Pensaram os pesquisadores: se perguntássemos a eles por quê da violência diriam : não sabemos, mas sempre foi assim, portanto deve ser assim!
Assim é: esquecemos boa parte dos porquês das coisas! Alguns nunca soubemos e tão pouco é nos dado a possibilidade de questionar. Não falo exatamente de questões coletivas, penso naquelas mais singulares, que contam da nossa história, do projeto de vida que ganhamos na fila da maternidade. 
Não sei ao certo a razão, talvez um tanto de comodismo, conformismo, até desesperança. As crianças nem tanto, não cansam de perguntar, perguntam até que nem a mãe, nem o pai, nem o Google saibam responder. São especialistas em duvidar das regras domésticas: banho, lição de casa, lugares pré determinados, horários! Mas nem sempre os temas são tão primatas, ops, primários. Hoje, por exemplo, travamos um longa discussão sobre inadequação e proibição. Fantástica! Se por um lado isso esgota nossas forças, por outro temos que garantir a persistência desse poderio de questionamento. 
Penso que não somos incorruptíveis, ao contrário, com o tempo temos a chance de enxergar com um pouco mais de clareza o controle que as tentações mundanas, relacionais e por que não as bananas e os cafés exercem sobre nós! 
Bom, é isso! 
Vamos tomar um cafezinho? 




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