terça-feira, 15 de janeiro de 2013

É doce morrer no mar ...



Um bebê chora para nunca mais. Seu silêncio dá lugar ao pranto do outro, para sempre. O corpo, cheio de carne e osso é amputado daquilo que nunca teve. Mesmo forte não foi capaz de impedir a dor. A vida, imanente a sua, perde seu brilho num instante de transcendência. O tempo, transitório, escoa pelas mãos num apego viscoso.

A mulher espera pelo seu marido a beira mar. A tempestade sussurra seu nome conservando na imagem o longo adeus. O poeta nos disse que os homens do mar não andam com a firmeza dos homens da terra. Amam com a doçura violenta da primeira vez porque bem sabem que pode ser a última. É doce morrer no mar ...

O risco não cessa. Deixa-se ludibriar pela ilusão da certeza. Acredita que conhece o perigo da esquina, o rumo da bala perdida, o resultado do exame, o tempo certo de socorrer a criança da queda. Mentira! Ele é cruel, chega sem avisar, faz do outro porta voz da sua presença. Impute a crença vã da escolha. Podemos apressar sua chegada, mas nunca adiar sua partida.

Deixa marcas eternas, dizem que as cicatrizes ficam na alma, sem possibilidade de reparação. Ninguém consegue vê-las, são silenciosas. Não há, nos dicionários do mundo, palavras para falá-las. Já vi gente paralisada pela sua intensidade. Como se as mãos perdessem suas forças, não mais cuidam ou alimentam, receiam pelo toque, desmerecem os compreensivos. O que pedem é a solidão do reconhecimento.

Há os que não suportam nem o seu cheiro, fogem, covardes, temerosos do contágio pela dor. Não é de pegar e tão pouco tem remédio. É de respeitar e esperar, nem à frente nem atrás, taciturno como os íntimos.

Um acontecimento abrirá uma brecha para o outro entrar. Fique atento! Não se sinta um traidor, a ausência se faz presente pelo outro.

Ela não poderia entregar seu corpo a outro homem. Foi traída por Iemanjá.

Ele não poderia oferecer seus braços a outro bebê, sendo que o dele nunca pode ser carregado. Mas naquele dia foi preciso. De sobressalto foi escolhido. Quando viu tinha nas mãos outra menina, de outra pessoa e calado como a noite, batizou sua testa com uma lágrima de saudades.   


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